sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Ao útero da terra





Me destes olhos
quais puderam ver a beleza além da fronte
Me destes mãos
quais passaram por podres carnes
mas puderam tocar teus cabelos ralos e perfumados
Me destes dois pés
perco-me, encontro-me, em tantos quadrados de chão
Criei um mundo pra mim
enquanto podia estar cega de realidade
Eu escolhi voar
enquanto tu rasgavas o coração
e distribuía dentre as lágrimas que os covardes bebem
Eu não sei quem sou, nem onde quero chegar
tu caminhas para o futuro
e por onde vai brotam flores
Sabe da dor, se perde nela
Eu vago na rua deserta da alegria
Brindo o amor com os amigos
choro sozinha no banheiro sujo
Tu que me empurrastes pro abismo
como uma mãe passarinha
Viu-me pegar os ventos quentes
que migravam pra outra direção
e só voltar quando nada mais me fazia sentido
querendo teus braços por mais uns tempos
e deixando-te de novo a esperar meus braços
Não pude ver teu choro, pois eu estava dormindo
Eu sonhava
Tu cantavas para o mundo em tuas costas
e ouvia o eco no vazio dos homens
e nem assim deixastes o teu filho
este que é o maior e mais cruel de todos
Não sei se vou longe
repito, nem mesmo sei por onde a trilha segue
Tu que sabes de tudo
e ainda assim de nada sabe
Ergue-me tuas mãos
mas não antes de tocar o teu próprio corpo
e não te preocupes
nestas horas estarei voando
Nos encontraremos após
num pequeno lugar
dos que amam e choram

Camila Brito
pintura de Colette Calascione

2 comentários:

  1. Mila que blog maravilhoso. Lindo um espetáculo.
    Ainda não sei mexer direito nesse treco, mas vou tentando.

    beijos

    ResponderExcluir